quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

O virtual cotidiano do real

Dizem que o Brasil é o país do samba, do futebol e do carnaval. Mas não é só isso não, o Brasil é também o país das novelas. É impossível pensar na televisão aberta brasileira e ignorar a supremacia das telenovelas. Somente no canal de maior audiência, a rede Globo, são exibidos quatro folhetins televisivos diariamente.


O que impressiona não é somente a quantidade, mas sim o universo irreal que criam as tramas, tanto dentro quanto fora da telinha. Os atores de novela recebem salários milionários, centena de vezes maiores do que daqueles que estudaram ou deram duro por outra profissão menos valorizada, são modelos a serem seguidos e ai deles se pisarem na bola. Ou melhor dizendo, ai deles se deixarem de interpretar na vida real...

Muito mudou com a ascensão e a conquista do espaço das telenovelas no cenário televisivo brasileiro. De programas de entretenimento as novelas passaram a ditar moda e comportamentos como nenhum outro símbolo cultural. Isso não quer dizer que novela seja algo cultural, afinal cultura é aquilo que reflete as características de um povo ou comunidade, será que as novelas fazem isso mesmo?

Muitos autores e defensores de novela dizem que ela é a “história da vida real” ou o “espelho do Brasil”. Um espelho com uma imagem embaçada só se for, e até mesmo distorcida, o qual mostra somente o belo e muitas vezes não mostra, mas sim demonstra como a vida deveria ser. Abordam que a novela traz a tona temas importantes a serem debatidos, abrindo os olhos de muitos acerca de temáticas polêmicas como doenças, vícios, relações interpessoais. Será que a novela é o melhor meio para veicular estes temas e ainda ditar tendências e comportamentos?

Não podemos esquecer que as novelas compreendem acima de tudo a um produto televisivo. É feita conforme os interesses de quem a produz aliado com os interesses de quem a recebe, critérios como audiência e marketing são mais valorizados na hora de sua produção do que critérios socioculturais ou educacionais. E é justamente aí que está a questão o lado educacional ou cultural da novela não traz o mesmo retorno do lado publicitário e do marketing. A roupa da personagem tal, o esmalte da outra, o corte de cabelo de uma, o corpo da outra, sempre tem alguém querendo ser na vida real o personagem fictício da novela das seis, das sete ou das oito (agora das nove!).

Sem contar que por mais que temas importantes sejam abordados, o que predomina nas novelas é o típico duelo entre o bem e o mal, a mocinha contra a vilã, sendo que a vilã é sempre mais comentada e elogiada por sua atuação. Sabotagens, assassinatos, roubos, corrupção são elementos cruciais do enredo de toda novela, que acabam passando ao telespectador a idéia de normalidade.

Enquanto produto de entretenimento a qualidade das novelas brasileiras são inquestionáveis e valorizadas até fora do país, o problema é justamente o alcance da proporção de veracidade que as novelas tanto querem transmitir. Veracidade que se confunde com ficção, bondade que se mescla com corrupção, mal que vence o bem, diversão que vira dominação.

Rafaela Righetti

Um comentário:

  1. Esse dai é bem aquela história do "mito do heroi", nota mil o texto.
    bom demais.

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